28 abril, 2009

Vírgula, vida, vírgula

Olho para meus anos e fico tentando achar os pontos que errei. Talvez se eu tivesse feito balé... Se a bicicleta fosse rosa, ou até lilás! Mas não. Era vermelha. Vermelha.

Eu me divertia com o jeito sem limites dos meninos, sempre ousando um galho mais alto, um cachorro mais feroz, um lugar mais longe. Mas eu era menina. E já assim, tão nova, os meninos sempre olharam de lado e se perguntavam 'o que ela quer com a gente?'. Rir!! Ir além!! Vocês sabem tanto!!!

E também as mães - de meninos e meninas - comentavam às 17:20h 'Não é boa companhia para a minha filha. Que coisa uma menina faz no meio dos meninos? Coisa boa não é.' Você só tem 7 anos...

E no primeiro soutien, 'agora é uma mocinha, deveria se comportar melhor'. Meio sem jeito com as conversas polidas, as risadas controladas, os sapatos lustrados, os cabelos extremamente penteados. Meio sem jeito com o queimado, e os olhos perdidos lá no campinho. A essa altura, para eles era chateação, 'tem que tomar cuidado, café com leite!'. Esquecem que sua latinha de bolas-de-gude foram ganhas honesta e merecidamente. De tantas, até trocavam! 'A carambola azul com amarela?'.

De repente a cidade está um pouco maior, e tudo cresce. Mistura o beijo e o pé´descalço. 'Ah, você é tão legal! Está sempre aqui e ri e joga!' E a inocência te faz crer que tudo bem, que é um elogio. Aguarde...

E a cidade cresceu de novo! É imensa! Podemos ir lá, cá, tem a música, tem as ruas cheias, os ônibus, e os prédios? A alma fica imensa, junto com a cidade. Mas agora é preciso cuidado, olhos atentos. E é preciso saber lidar com as coisas novas, com aquilo que você está se tornando. É agora! Defina seu caráter, sua personalidade, seus gostos, o que você é, em que time você joga, o que você quer, do que você gosta, a que grupo você pertence, quem são seus amigos, quem manda na casa, quem manda em você, quem pode e quem não pode, o juízo, a primeira vez, a segunda, o outro relacionamento, mais um, experiências, a esperteza, a clareza, a objetividade, o juízo 'muito nunca é pouco, filha', o que vai fazer quando sair da escola?, que profissão, como trabalhar, o bebê, a faculdade, ele chora, as festas, ele ri, troca - não era isso que eu queria, disse vovó e não mamãe, não ter, ter também, cadê o dinheiro?, o espaço, ocupa, desocupa, o bar, seu lugar, fome, muito espaço, o vazio, a melhor onda, o emprego, o feijão no fogo, também tem que sair!, pendura, o telefone não funciona, a sala inunda, ele quase fala mamãe, a paciência, Deus... o bebê acorda.

Antes de tudo isso que se vive, o mundo está pronto. E escolher a bicicleta errada pode ser fatal.

5 comentários:

  1. Tânia, fogo tens um fan do teu trabalho. Parabéns, muito bem escrito.

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  3. Ede Willians, cristianwassili20093 de julho de 2009 às 05:34

    De todo o meio espera-se um fim, um beijo, um toque, um abraço. Do fim nos resta lembrar do ínicio, um convite, um telefonema, um oi. Do ínicio, não sabíamos a quem chamar, sonhavamos a quem beijar, tocavamos a nós mesmos, fazíamos convites, telefonavamos, mas tudo o que queríamos era um simplório abraço.

    Adorei seus textos.

    Parabêns

    Ede Willians, vulgo "cristianwassili2009"

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  4. A velocidade dos fatos. De tudo. De nossas vidas. Isso te angustia? Isso me angustiou. Acredite, porque vivenciei isso. Rápido demais para entender o que está acontecendo. Como tentar desviar as atenções quando elas estão voltadas para você? Uma atitude em seu quadro social e moral é o que esperam. Um obstáculo. Dois obstáculos. Tudo ao mesmo tempo agora. E o tempo é curto. Não dá tempo de se posicionar. Quem sou eu? Uma fagulha na existência.

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